sexta-feira, 1 de maio de 2009

Poemas alheios: Quatro simples poemas barrocos

"Como ele queria ser beijado"

Na boca só, e mais não
P'ra descer ao coração.
Nem tão livres, nem forçados,
Nem com língua de atrasados.

Nem de menos, nem fartanças,
Que isso é jogo de crianças.
Nem muito alto, nem baixinho:
No meio está certo o caminho.

Nem perto, nem longe - eu sei
Que isto assusta, aquilo dói.
Nem tão seco, nem molhado,
Tal por Adónis a Vénus dado.

Nem tão manso, nem tão fera,
Ou é já, ou fica à espera.
Nem devagar, nem com pressa,
Nem em qualquer ponto ou peça.

Meio mordidos, meio soprados,
Os lábios meio enterrados.
A uma hora decente,
E antes só do que entre gente.

E cada um beijar há-de
Como sabe, quer, deve ou pode!
Meu amor e eu saberemos
Como bem nos beijaremos!

Paul Fleming


"Soneto Alegórico"

Amanda, amor, peitilho p'ra frios corações,
Precioso cofre de ouro, tochar ardente do amor,
Fole de meus suspiros, mata-borrão da dor,
Areia de meus males, bálsamo de aflições,

Chama de minhas velas, de meus gozos manjar,
Bacio de meu descanso, da poesia clister,
Néctar de minha boca, pròs olhos um prazer,
Lugar de reverências, mestra de bem zombar,

Um poço de virtudes, calendário de meu tempo,
Facho de devoção, fonte de encantamento,
Tu, abismo profundo cheio de manhãs amenas,

Maçapão de minh'alma, e das línguas melaço,
E tudo o mais, amiga, que aqui deixar não posso,
Pinça de meus tormentos e espanador das penas.

Anónimo


"A Sílvia"

Porque praguejas, Sílvia, quando esta negra mão
C'o teu seio quer brincar?
Era alva como tu, e o fogo da paixão
Assim a fez ficar.
Se com teu fogo vens meu corpo incendiar,
De mármore nem neve pode a minha mão ser.
Dizes-lhe que não busque e não faça o que faz.
Tens Razão. Há-de ser.
Mais não busca que a ti, mais não quer do que paz
E seu jogo jogar.
De que te queixas, pois? E que razões ter julgas,
Já que favores iguais não os negas às pulgas?

Benjamin Neukirch


"Multiplicação dos cornos"

1

Quem tem mulher e não adivinha
Que ela lhe anda a fugir da linha -
Uma ingenuidade como esta
Merece bem um corno na testa.

2

Quem em segredo quase receia
Que a mulher bata a porta alheia -
Homens como este, desconfiados,
Pedem um par de cornos afiados.

3

Quem sabe, mas não quer saber,
Que a mulher o engana a valer -
De tão boa e tão pia, esta peça
Tem três cornos no alto da cabeça.

4

E quem com ela fica depois disso,
Para ela a outros ir prestar serviço -
Esse fica bem ornamentado
Com quatro cornos de lado a lado.

5

Mas aquele que ignora boatos
E diz que os cornudos ornatos
Não são para ele - esse, sem saber,
Em vez de quatro, cinco há-de ter!

Johann Michael Moscherosch


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Nota:
Todos estes poemas foram traduzidos da língua alemã para a língua portuguesa por João Barrento